Memorial
do Leitor
Meu contato com as letras foi em uma sala nos fundos da casa
da Srª Madalena, vizinha da casa dos meus pais, lembro-me da sala com paredes
coloridas cheia de letras cursivas e desenhos e principalmente das crianças que
eram meus coleguinhas de brincadeiras na rua.
Fiz meu pré-escolar em uma
escola católica, onde aprendi a ler e a escrever e fui motivo de orgulho para
minha família quando fui escolhida como oradora da
classe.
A escola regular que estudei nos meus
primeiros quatro anos era no final da rua onde morava, minha vizinha chamada
Flávia Sousa possuía a assinatura da revistinha Nosso Amiguinho, que eu adorava
, ficávamos lendo e fazendo as atividades. As revistinhas chegavam pelos correios
e eram motivo de muita alegria, cada exemplar vinha recheado de historinhas
novas e atividades que nos chamavam atenção e, aquelas revistinhas, feitas para
colorir e cheias de figuras despertavam em mim uma vontade imensa de ler e
escrever. Não me recordo de outro tipo de leitura ter chamado tanto a minha
atenção, por outro lado, os números, ah, os números, esses sim eram pra mim um
grande desafio, tinha dificuldade e para aprender decorei a tabuada. Na época
era assim que se aprendia, através do “Decoreba”, a professora sempre tomava a
tabuada da turma, era um momento de muita apreensão, porque se não
respondêssemos direito, além de levar uma tremenda bronca, tínhamos que
conviver com a risada dos coleguinhas.
Na leitura eu me encontrava, aquelas
palavras me transportavam para um mundo mágico, um mundo que me mostrava que
tudo era possível, um mundo em que tudo era perfeito e prazeroso.
O gosto pela leitura aumentou quando
descobri os almanaques que minha prima Ceiça Barbosa comprava em bancas de
jornais e era o que eu lia com frequência, não tínhamos o hábito em pegar
livros em bibliotecas.
O tempo passou, deixei de lado as revistinhas e os almanaques
e descobri um outro tipo de leitura, que condizia mais com a minha idade,
afinal, como dizia minha mãe “ eu já era mocinha” descobri os romances, as histórias de Júlia, Sabrina e Bianca, mas eram as histórias de Bárbara
Cartland que me encantavam, em meus
sonhos eu sempre era uma das heroínas, construía um mundo particular habitado
de castelos, duques, príncipes, toda a
realeza e aquele ambiente
de sonhos. Eu era a princesa da história, lá era o meu mundo intocável.
Durante o Ensino Médio, iniciei um
curso de inglês, na época era moda, viajava com as traduções das musicas
românticas de U2, The Cure, Cyndi Louper, A-Há, David Bowie e tantas outras,
sonhava em falar inglês fluentemente e cantar em inglês, na verdade esse era o
desejo da maioria das meninas na minha idade. Para distrair-me durante o
caminho de ida e volta para o curso, que era feito de ônibus, comecei a pegar
livros na biblioteca da escola e com isso iniciou-se um círculo do livro entre
eu, minha mãe Valda, minha prima Ceiça e uma amiga de minha mãe chamada Cecé. Nesse
círculo tínhamos um compromisso de todas nós lermos todos os livros
escolhidos um pelas outras e com isso
variávamos, líamos romances, histórias policiais, terror, suspense, dramas.
Lembro-me de ler nessa época Sidney
Sheldon, Agatha Christie, Arthur Conan Doyle, Danielle Steel, Pollyanna, mas o
livro que mais me impressionou foi o livro “O
exorcista”, eu o lia em todos os momentos livres que tinha, mas não tinha
coragem de lê-lo à noite ou se estivesse sozinha em casa.
Nesse período detestava os clássicos
que no Ensino Médio eram impostos em sala de aula, achava a leitura cansativa e
as histórias sem sentido, estava em uma fase que queria aventuras e romances,
leituras de acordo com o que estava vivendo ou sonhando em viver e ler
“Memórias Póstumas de Brás Cubas”, era entediante.
Quando entrei na Faculdade, estava
casada e tinha um filho, fiz o vestibular por insistência de minha amiga Maria,
que precisava de incentivo para prestar o vestibular também.
A escolha pelo curso de Letras foi
mais pelas condições financeiras e pela proximidade com a Faculdade, que pela
vocação, não tinha pretensão em me tornar professora naquela época, voltei a
estudar mais pelo status em ter nível superior que pela profissão.
No primeiro dia de aula, levei um
susto ao deparar-me com um texto de filosofia, não entendia nada que lia e
pensei logo nos cheques pré-datados que tinha deixado na tesouraria da
instituição, quase desisti, voltei para casa frustrada, achando que tinha dado
um passo maior que a minha perna.
Já no segundo dia tudo foi diferente,
minha professora era fantástica, Professora Eliane Farias, Teoria Literária,
ela falava e eu compreendia perfeitamente suas teorias, sua voz calma chamava
minha atenção.
Ler nesse período era cansativo, não
conseguia ler por prazer, lia focada nos roteiros literários determinados pelos
professores e quando terminei meu curso estava estafada.
Acredito que ler seja um despertar,
mas no meu caso esse “despertar” tem altos e baixos, passo por períodos em que
leio em qualquer lugar e tudo que me cai às mãos e períodos em que só em olhar
um livro confesso que sinto preguiça. Mas tenho plena consciência da grande
importância da leitura e do poder que a leitura têm de nos transportar para
mundos particulares, acalentadores e mágicos.
E como diz Mário Quintana:
“Dupla
delícia
O livro
traz a vantagem de a gente poder estar só e ao mesmo tempo acompanhado”.
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